sexta-feira, 27 de maio de 2011
A arte das musas: "o fetichismo na música" (Theodor W. Adorno)
"[...] a música constitui, ao mesmo tempo, a manifestação imediata do instinto humano e a instância própria para o seu apaziguamento. Ela desperta a dança das deusas, ressoa da flauta de Pã, brotando ao mesmo tempo da lira de Orfeu, em torno na qual se congregam saciadas as diversas formas do instinto humano. Toda vez que a paz musical se apresenta perturbada por excitações bacânticas, pode-se falar em decadência do gosto. Entretanto, se desde o tempo da noética grega a função disciplinadora da música foi considerada um bem supremo e como tal se manteve, em nossos dias, certamente mais do que em qualquer outra época histórica, todos tendem a obedecer mais cegamente à moda musical, como aliás acontece igualmente em outros setores. Contudo, assim como não se pode qualificar de dionísica a consciência musical contemporânea das massas, da mesma forma pouco têm a ver com o gosto artístico em geral as mais recentes modificações desta consciência musical. O próprio conceito está ultrapassado. A arte responsável orienta-se por critérios que se aproximam muito do conhecimento: o lógico e o ilógico, o verdadeiro e o falto. [...']. Se perguntarmos a alguém se 'gosta' de uma música de sucesso lançada no mercado, não conseguiremos furtar-nos à suspeita de que o gostar e o não gostar já não correspondem ao estado real, ainda que a pessoa interrogada se exprima em termos de gostar e não gostar. [...] o critério de julgamento ''e o fato de a canção de sucesso ser conhecida de todos. [...] poder-se-ia perguntar: para quem a música de entretenimento serve ainda como entretenimento? Ao invés de entreter, parece que tal música contribui ainda mais apara o emudecimento dos homens, para a morte da linguagem como expressão, para a incapacidade de comunicação. A música de entretenimento preenche os vazios do silência que se instalam entre as pessoas deformadas pelo medo, pelo cansaço e pela docilidade de escravos sem exigência. [...] Se ninguém mais é capaz de falar realmente, é óbvio também que já ninguém é capaz de ouvir. [...]."
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