sexta-feira, 25 de novembro de 2011
As cidades se fecham em si mesmas. O argumento da degradação das relações humanas cria o elogio à violência. Que além de espiada e pensada. Coloca-se cada vez mais presente. No grande mundo através de guerras. No mundo interior na forma de discriminação. Uma série de pequenas maldades. Se destilam em nossas almas e mentes. Desejos íntimos de execuções sumárias. Admiração a justiceiros genocidas. Vem a nos preencher o interior vazio da consciência. Como um elixir entorpecente. Transborda nossas grutas interiores. Com desejo de morte e odor pútrido. Pra tudo aquilo que não entendemos. Que não conhecemos. Sem que isso crie em mim ou em você. Necessidade alguma de maior compreensão. Nem mesmo capacidade de sentir ou colocar-se no lugar do outro. E novamente tomados de desejos egoístas e assassinos. Clamamos: penas de morte e chacinas em nome de segurança. Cidades cada vez mais fechadas, condomínios, ruas particulares. Milícias, shoppings e torres de vidro blindado. Que nos assegurem de nossa própria vontade demente. De punir infratores. As infrações são sempre alheias. Estamos quase sempre ungidos de inocência e boa vontade. Não há nada de errado em se dar bem. Não hei de me tornar alvo por ser bem sucedido. E assim fecho-me em muralhas. O imperativo é nos isolarmos cada vez mais com nossas migalhas. Que se limpe a cidade: de ruídos noturnos, esmolantes, dos sujos, dos caídos, da alegria subversiva das meninas e meninos de rua, do vigor da prostituição, do apagado colorido dos bares populares, dos cães de rua e seus respectivos donos, dos catadores de reciclável, da permissividade boemia, da essência humana que coabita na coexistência dos diferentes. Vamos limpar das cidades o desejo humano do prazer do sexo. Permeados em olhos famintos que desejam e comem. O Brasil que tem fome. Nos isolando na reclusa solidão de nossas casas e apartamentos. Gozando a mais profunda perversão de nossos sentidos solos. Engaiolando nossas súplicas e desejos numa oração profana. Cada vez mais egoístas, solitários nefandos. A ordem se constrói de entradas e saídas. Ausgang-Eingang. Nossas cidades estão se tornando sítios dentro de gaiolas. Será que o Ibama conseguirá libertá-las? Sendo assim, mestiços, negros e nordestinos devem saber. Colocar-se, e apreciar as entradas de serviço. Pois isso corrobora para a segurança das pessoas normais. “Estado de Sítio”, faixa 5 do disco diáspora afronética.
segunda-feira, 24 de outubro de 2011
A violência é tão fascinante. E nossas vidas são tão normais. E você passa de noite e sempre vê. Apartamentos acesos. Tudo parece ser tão real. Mas você viu esse filme também. Andando nas ruas. Pensei que podia ouvir. Alguém me chamando. Dizendo meu nome.
Já estou cheio de me sentir vazio. Meu corpo é quente e estou sentindo frio. Todo mundo sabe e ninguém quer mais saber. Afinal, amar o próximo é tão demodé. Essa justiça desafinada. É tão humana e tão errada. Nós assistimos televisão também. Qual é a diferença? Não estatize meus sentimentos. Pra seu governo, o meu estado é independente.
Já estou cheio de me sentir vazio. Meu corpo é quente e estou sentindo frio. Todo mundo sabe e ninguém quer mais saber. Afinal, amar o próximo é tão demodé.
terça-feira, 23 de agosto de 2011
Lá está ela, mais uma vez. Não sei, não vou saber, não dá pra entender como ela não se cansa disso. Sabe que tudo acontece como um jogo, se é de azar ou de sorte, não dá pra prever. Ou melhor, até se pode prever, mas ela dispensa.
Acredito que essa moça, no fundo gosta dessas coisas. De se apaixonar, de se jogar num rio onde ela não sabe se consegue nadar. Ela não desiste e leva bóias. E se ela se afogar, se recupera.
Estranho e que ela já apanhou demais da vida. Essa moça tem relacionamentos estranhos, acho que ela está condicionada a ser uma pessoa substituta. E quem não é?
A gente sempre acha que é especial na vida de alguém, mas o que te garante que você não está somente servindo pra tapar buracos, servindo de curativo pras feridas antigas?
A moça…ela muito amou, ama, amará, e muito se machuca também. Porque amar também é isso, não? Dar o seu melhor pra curar outra pessoa de todos os golpes, até que ela fique bem e te deixe pra trás, fraco e sangrando. Daí você espera por alguém que venha te curar.
Às vezes esse alguém aparece, outras vezes, não. E pra ela? Por quem ela espera?
E assim, aos poucos, ela se esquece dos socos, pontapés, golpes baixos que a vida lhe deu, lhe dará.
A moça – que não era Capitu, mas também têm olhos de ressaca – levanta e segue em frente.
Não por ser forte, e sim pelo contrário… Por saber que é fraca o bastante para não conseguir ter ódio no seu coração, na sua alma, na sua essência. E ama, sabendo que vai chorar muitas vezes ainda. Afinal, foi chorando que ela, você e todos os outros, vieram ao mundo.
(Caio Fernando Abreu)
domingo, 21 de agosto de 2011
O Grande Sonho
Fevereiro de 1917. Comeca a revolucao mais violenta de todos os tempos. Em uma semana a sociedade se desfaz de todos os seus dirigentes: o monarca e seus homens da lei, a polícia e os sacerdotes; os proprietários e os gerentes, os oficiais e os amos.
Fevereiro de 1917. Comeca a revolucao mais violenta de todos os tempos. Em uma semana a sociedade se desfaz de todos os seus dirigentes: o monarca e seus homens da lei, a polícia e os sacerdotes; os proprietários e os gerentes, os oficiais e os amos. Nao há cidadao que nao se sinta livre para decidir em cada momento sua conduta e seu porvir. Surge entao, das profundezas da Rússia, um imenso grito de esperanca, nessa voz se mescla a voz de todos os desesperados, os humilhados e os desemparados. Em Moscou, os operários obrigam seus donos a aprender as bases do novo direito operário. Em Odessa, os estudantes ditam ao seu professor um novo programa de história das civilizacoes; no exército os soldados deixam de obedecer aos seus superiores. NINGUÉM JAMAIS HAVIA SONHADO COM UMA REVOLUCAO ASSIM. Agora esse sonho circula pelas veias de todas as almas desesperadas e desemparadas deste planeta. O Grande sonho A grande debilidade de muitos ?revolucionários? consiste em sua absoluta incapacidade de entusiasmar-se, de elevar-se sobre o nível rotineiro das trivialidades, de fazer surgir um vínculo vital entre ele e os que o rodeiam. O que nao pode incendiar-se, nao pode incendiar sua vida nem a dos demais. A fria malevolencia nao é o bastante para apoderar-se da alma das massas. Muitos revolucionários contemplaram a revolucao com um invejoso espanto. É que a vida pessoal dos revolucionários dificulta sua percepcao dos grandes acontecimentos dos quais participa. Mas as tragédias das paixoes individuais exclusivas é demasiado insípida para o nosso tempo. Porque vivemos em uma época de paixoes sociais. A grande tragédia de nossa época consiste no choque da personalidade individual com a comunidade. Para alcancar o nível de heroísmo e custear o terreno dos grandes sentimentos que dao vida, é necessário que a consciencia se sinta ganha por grandes objetivos. Toda catástrofe individual ou coletiva é sempre uma pedra de toque, pois desnuda as verdadeiras relacoes pessoais e sociais. Hoje em dia é necessário provar este mundo. O poeta, por exemplo, se sentiu independente do burgues e até se enfrentou com ele. Mas quando o assunto se tratou da revolucao, se mostrou um parasita até a medula dos ossos. A psicologia do indivíduo assim mantido e dedicado a ser sanguessuga humano, nao tem rastros de bondade de caráter, respeito ou devocao. Hoje em dia os ?mocinhos? estudam ainda em livros as custas do sacrifício dos explorados, se exercitam em periódicos e criam ?novas tendencias?. Mas quando uma revolta se produz seriamente, em seguida, descobrem que a arte se encontra nas cabanas, nos buracos mais reconditos, onde fazem ninho os cupins. É preciso derrubar a burguesia porque é ela quem fecha o caminho a cultura. A nova arte nao só desnudará a vida, mas lhe arrancará a pele. Amar a vida com o afeto superficial do deleitante, nao é muito mérito. Amar a vida com os olhos abertos, com um sentido crítico cabal, sem adornos, tal como nos aparece, com o que oferece, essa é a proeza. A proeza também é realizar um apaixonado esforco por sacudir aqueles que estao entorpecidos pela rotina, obrigar-lhes a abrir os olhos e fazer-lhes ver o que se aproxima.
León Trotsky
Fevereiro de 1917. Comeca a revolucao mais violenta de todos os tempos. Em uma semana a sociedade se desfaz de todos os seus dirigentes: o monarca e seus homens da lei, a polícia e os sacerdotes; os proprietários e os gerentes, os oficiais e os amos.
Fevereiro de 1917. Comeca a revolucao mais violenta de todos os tempos. Em uma semana a sociedade se desfaz de todos os seus dirigentes: o monarca e seus homens da lei, a polícia e os sacerdotes; os proprietários e os gerentes, os oficiais e os amos. Nao há cidadao que nao se sinta livre para decidir em cada momento sua conduta e seu porvir. Surge entao, das profundezas da Rússia, um imenso grito de esperanca, nessa voz se mescla a voz de todos os desesperados, os humilhados e os desemparados. Em Moscou, os operários obrigam seus donos a aprender as bases do novo direito operário. Em Odessa, os estudantes ditam ao seu professor um novo programa de história das civilizacoes; no exército os soldados deixam de obedecer aos seus superiores. NINGUÉM JAMAIS HAVIA SONHADO COM UMA REVOLUCAO ASSIM. Agora esse sonho circula pelas veias de todas as almas desesperadas e desemparadas deste planeta. O Grande sonho A grande debilidade de muitos ?revolucionários? consiste em sua absoluta incapacidade de entusiasmar-se, de elevar-se sobre o nível rotineiro das trivialidades, de fazer surgir um vínculo vital entre ele e os que o rodeiam. O que nao pode incendiar-se, nao pode incendiar sua vida nem a dos demais. A fria malevolencia nao é o bastante para apoderar-se da alma das massas. Muitos revolucionários contemplaram a revolucao com um invejoso espanto. É que a vida pessoal dos revolucionários dificulta sua percepcao dos grandes acontecimentos dos quais participa. Mas as tragédias das paixoes individuais exclusivas é demasiado insípida para o nosso tempo. Porque vivemos em uma época de paixoes sociais. A grande tragédia de nossa época consiste no choque da personalidade individual com a comunidade. Para alcancar o nível de heroísmo e custear o terreno dos grandes sentimentos que dao vida, é necessário que a consciencia se sinta ganha por grandes objetivos. Toda catástrofe individual ou coletiva é sempre uma pedra de toque, pois desnuda as verdadeiras relacoes pessoais e sociais. Hoje em dia é necessário provar este mundo. O poeta, por exemplo, se sentiu independente do burgues e até se enfrentou com ele. Mas quando o assunto se tratou da revolucao, se mostrou um parasita até a medula dos ossos. A psicologia do indivíduo assim mantido e dedicado a ser sanguessuga humano, nao tem rastros de bondade de caráter, respeito ou devocao. Hoje em dia os ?mocinhos? estudam ainda em livros as custas do sacrifício dos explorados, se exercitam em periódicos e criam ?novas tendencias?. Mas quando uma revolta se produz seriamente, em seguida, descobrem que a arte se encontra nas cabanas, nos buracos mais reconditos, onde fazem ninho os cupins. É preciso derrubar a burguesia porque é ela quem fecha o caminho a cultura. A nova arte nao só desnudará a vida, mas lhe arrancará a pele. Amar a vida com o afeto superficial do deleitante, nao é muito mérito. Amar a vida com os olhos abertos, com um sentido crítico cabal, sem adornos, tal como nos aparece, com o que oferece, essa é a proeza. A proeza também é realizar um apaixonado esforco por sacudir aqueles que estao entorpecidos pela rotina, obrigar-lhes a abrir os olhos e fazer-lhes ver o que se aproxima.
León Trotsky
sábado, 9 de julho de 2011
Trocando em Miúdos
Chico Buarque
Eu vou lhe deixar a medida do Bonfim
Não me valeu
Mas fico com o disco do Pixinguinha, sim!
O resto é seu
Trocando em miúdos, pode guardar
As sobras de tudo que chamam lar
As sombras de tudo que fomos nós
As marcas de amor nos nossos lençóis
As nossas melhores lembranças
Aquela esperança de tudo se ajeitar
Pode esquecer
Aquela aliança, você pode empenhar
Ou derreter
Mas devo dizer que não vou lhe dar
O enorme prazer de me ver chorar
Nem vou lhe cobrar pelo seu estrago
Meu peito tão dilacerado
Aliás
Aceite uma ajuda do seu futuro amor
Pro aluguel
Devolva o Neruda que você me tomou
E nunca leu
Eu bato o portão sem fazer alarde
Eu levo a carteira de identidade
Uma saideira, muita saudade
E a leve impressão de que já vou tarde.
quinta-feira, 7 de julho de 2011
terça-feira, 5 de julho de 2011
sexta-feira, 27 de maio de 2011
A arte das musas: "o fetichismo na música" (Theodor W. Adorno)
"[...] a música constitui, ao mesmo tempo, a manifestação imediata do instinto humano e a instância própria para o seu apaziguamento. Ela desperta a dança das deusas, ressoa da flauta de Pã, brotando ao mesmo tempo da lira de Orfeu, em torno na qual se congregam saciadas as diversas formas do instinto humano. Toda vez que a paz musical se apresenta perturbada por excitações bacânticas, pode-se falar em decadência do gosto. Entretanto, se desde o tempo da noética grega a função disciplinadora da música foi considerada um bem supremo e como tal se manteve, em nossos dias, certamente mais do que em qualquer outra época histórica, todos tendem a obedecer mais cegamente à moda musical, como aliás acontece igualmente em outros setores. Contudo, assim como não se pode qualificar de dionísica a consciência musical contemporânea das massas, da mesma forma pouco têm a ver com o gosto artístico em geral as mais recentes modificações desta consciência musical. O próprio conceito está ultrapassado. A arte responsável orienta-se por critérios que se aproximam muito do conhecimento: o lógico e o ilógico, o verdadeiro e o falto. [...']. Se perguntarmos a alguém se 'gosta' de uma música de sucesso lançada no mercado, não conseguiremos furtar-nos à suspeita de que o gostar e o não gostar já não correspondem ao estado real, ainda que a pessoa interrogada se exprima em termos de gostar e não gostar. [...] o critério de julgamento ''e o fato de a canção de sucesso ser conhecida de todos. [...] poder-se-ia perguntar: para quem a música de entretenimento serve ainda como entretenimento? Ao invés de entreter, parece que tal música contribui ainda mais apara o emudecimento dos homens, para a morte da linguagem como expressão, para a incapacidade de comunicação. A música de entretenimento preenche os vazios do silência que se instalam entre as pessoas deformadas pelo medo, pelo cansaço e pela docilidade de escravos sem exigência. [...] Se ninguém mais é capaz de falar realmente, é óbvio também que já ninguém é capaz de ouvir. [...]."
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